30/4/2010 - Revista Consultor Jurídico
TJ-SP tranca ação penal contra membro da Universal
Por: Fernando Porfírio
O Tribunal de Justiça de São Paulo mandou trancar a ação penal contra Veríssimo de Jesus, integrante da Igreja Universal do Reino de Deus. A decisão, por maioria de votos, é da 16ª Câmara Criminal. Veríssimo e mais nove membros da IURD, inclusive o líder, Edir Macedo, foram denunciados pelo Ministério Público de São Paulo pelos crimes de formação de quadrilha ou bando e lavagem de dinheiro. Em agosto, a Justiça paulista recebeu a denúncia e transformou os acusados em réus.
A turma julgadora entendeu que o Ministério Público não conseguiu apontar contra Veríssimo de Jesus indícios suficientes de seu efetivo envolvimento com a organização criminosa que supsotamente atuava dentro da igreja. Essa organização, de acordo com a denúncia, foi constituída, em tese, para a prática de crimes patrimoniais e de lavagem de dinheiro obtidos dos fiéis.
“A acusação sem prova, sequer indiciária, inviabiliza o recebimento da denúncia e a instauração do processo criminal, tornando descabida a pretensão punitiva”, decretou o relator do recurso. A decisão foi tomada em pedido de Habeas Corpus apresentado pelos advogados Daniel Bialski e Hélio Bialski.
A defesa apontou que seu cliente era vítima de constrangimento ilegal da parte do juiz da 9ª Vara criminal da Capital, Gláucio Roberto Brittes de Araújo. O processo 1.121/09 corre em segredo de justiça. No pedido de Habeas Corpus a defesa sustentou a tese de ausência de justa causa. Procurados pela revista Consultor Jurídico, os advogados não quiseram se manifestar sobre o caso.
A turma julgadora chegou à conclusão de que as provas colhidas pelo MP não conseguem sustentar a inicial. Segundo o relator, Jesus Veríssimo ingressou na sociedade, como diretor de duas empresas, em 25 de fevereiro de 2008. Essa data é posterior aos documentos usados pela acusação. O acusado deixou o cargo 18 meses depois, em 5 de agosto de 2009. A conclusão a que chegou o relator foi de que a prova documental não coincide com o período da gestão de Jesus Veríssimo à frente das empresas.
“O próprio relatório do Coaf (Conselho de Controle de Atividades Financeiras), que discrimina o volume de recursos financeiros movimentados pelos denunciados, é restrito ao período de março de 2001 a março de 2008, enquanto o ingresso do paciente no quadro social é de fevereiro de 2008”, apontou o relator.
Segundo a turma julgadora, o único elemento a envolver o acusado – sua condição de sócio-diretor das empresas – não é suficiente para instaurar contra ele a ação penal pelos delitos de natureza coletivas descritos na denúncia do Ministério Público.
A denúncia
Jesus Veríssimo foi denunciado pelo Ministério Público porque, durante um ano, a partir de março de 2008, figurou como diretor de duas empresas – a Cremo S/A e a Unimetro S/A. Segundo a denúncia, elas eram usadas pelo grupo para movimentar e dissimular a origem do dinheiro arrecadado dos fiéis. Segundo o MP, o dinheiro arrecadado nos cultos era transferido para as duas empresas que, por sua vez, o remetiam para outras duas sociedades sediadas em paraísos fiscais: a Cableinvest Limited e a Investholding Limited.
Ainda segundo o MP, o dinheiro voltava ao Brasil sob a forma de “empréstimos” simulados em contratos de mútuo entre as duas empresas localizadas em paraísos fiscais e “laranjas”, integrantes do grupo acusado. Os recursos repatriados eram, então, usados na compra de empresas de comunicação, como a TV Record.
Ou seja, a Cremo e a Unimetro, de acordo com a denúncia, eram apenas usadas para dissimular e ocultar a natureza, origem, localização e propriedade dos valores arrecadados pelos estelionatários em prejuízo dos fiéis e da própria entidade religiosa.
Em outras palavras, o apoio de Jesus Veríssimo, ou sua contribuição decisiva para a lavagem de dinheiro, segundo a denúncia do Ministério Público, decorre do empréstimo de seu nome para a constituição ou manutenção do quadro social das empresas Cremo e Unimetro. Através dessas empresas o produto da arrecadação ilícita era remetido para o exterior com o objetivo de encobrir sua origem.
De acordo com o Ministério Público, Jesus Veríssimo e os outros nove acusados lavavam recursos desviados IURD de maneira reincidente. Veríssimo e seus amigos praticavam estelionato contra os fiéis da Igreja. Em seguida, os acusados ocultavam e dissimulavam a natureza, origem localização, movimentação e propriedade dos valores resultante das doações.
Descreve a denúncia do MP que os líderes da Igreja Universal do Reino de Deus, reunidos em quadrilha, durante dez anos, coletaram grande quantidade em dinheiro, vindo da contribuição de fiéis que, crentes na promessa de que a generosidade financeira para com a Igreja seria retribuída com a graça da realização pessoal, física ou financeira.
Segundo a denúncia, Edir Macedo era o chefe da quadrilha que usava empresas de fachada para desviar recursos provenientes de doações dos fiéis da igreja e praticar uma série de fraudes.
Ação inépta
A turma julgadora entendeu que a descrição genérica e vaga da conduta, quando se trata de delitos societários ou coletivos, deve ser considerada grave vício de forma e conteúdo, numa verdadeira afronta ao artigo 41 do Código de Processo Penal. “Para o recebimento da denúncia, é sabido, há de existir, nos documentos que a sustentam, algum fundamento fático-jurídico que vislumbre a viabilidade da demanda penal”, afirmou o relator.
Para o relator, a inépcia da inicial em relação a Jesus Veríssimo se evidencia pela omissão daquilo que consistiria sua participação na empreitada criminosa. “Assim como pela falta de descrição do vínculo subjetivo que o ligaria aos demais denunciados, apontados como líderes da igreja”, destacou o relator.
Segundo a denúncia, em 2004 e 2005, as empresas Unimetro Empreendimentos e Cremo Empreendimentos receberam R$ 71 milhões da Igreja Universal. O dinheiro foi usado em benefício da quadrilha denunciada, o que, em tese, desvirtua a finalidade das doações à Universal, que tem isenção de impostos.
Edir Macedo não aparece nominalmente como sócio das empresas, mas depoimentos e outras provas colhidas ao longo das investigações apontam o fundador e líder da Universal como verdadeiro dono das empresas montadas para lavar o dinheiro recolhido de fiéis.
Edir Macedo também é acusado de usar o nome de laranjas para comprar emissoras de rádio e TV que hoje compõem a Rede Record. Ele é acusado de fraudar procurações assinadas por estes laranjas para, posteriormente, transferir as ações das emissoras para seu próprio nome ou de pessoas acusadas de participar da quadrilha.
Além de Edir Macedo foram denunciados Alba Maria da Costa, Edilson da Conceição Gonzales, Honorilton Gonçalves da Costa, Jerônimo Alves Ferreira, João Batista Ramos da Silva, João Luis Dutra Leite, Mauricio Albuquerque e Silva, Osvaldo Sciorilli e Veríssimo de Jesus.
O processo corre na 9ª Vara Criminal da Capital. A investigação, que deu origem á Ação Penal, foi patrocinada pelo Ministério Público. Segundo o MP, somando transferências atípicas e depósitos bancários feitos por pessoas ligadas à IURD, o volume financeiro da igreja de março de 2001 a março de 2008 foi de R$ 8 bilhões. Estas informações são confirmadas pelo Coaf, órgão do Ministério da Fazenda. Os recursos teriam servido para comprar emissoras de TV e rádio, financeiras e agência de turismo e jatinhos.
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